segunda-feira, agosto 07, 2006

Observação e cronologia da crise de Timor-Leste em 2006 (IV) - trad.

Tradução da Margarida:

Envolvimento Internacional

A disputa dos soldados foi mais longe do que os casos anteriores em 2002, 2004 e 2005 porque as figuras publicas envolvidas acreditavam que tinham apoio internacional que lhes garantiria que o governo de Alkatiri seria removido.

O primeiro indicador sério disso foi a postura dos Embaixadores dos USA e da Austrália na reunião do Conselho de Segurança da ONU em 5 de Maio. Primeiro o Ministro dos Estrangeiros Horta e depois o Representante Hasegawa e o Secretário-geral Annan pediram um mandato de 12 meses para uma nova missão da ONU em Timor-Leste para assistir até depois das eleições de 2007. Depois todos os outros oradores concordaram, excepto a Austrália e os USA. Só quiseram uma extensão do mandato de Hasegawa por um mês e foi o que aconteceu. A opinião dos USA era estender até 20 de Junho e depois ver o que fazer. Este recuo foi rapidamente re-apresentada como um passo positivo pela ONU, mas foi uma recusa brusca e não colaborante para responder à opinião Timorense e do mundo.

O segundo indicador veio na semana seguinte quando o Comité da Segurança Nacional da Austrália se reuniu e decidiu mobilizar uma força de intervenção. Isso foi anunciado em 12 de Maio e o Primeiro-Ministro Howard então viajou para os USA, Canadá, e Irlanda. Este passo contradisse a postura pública tomada na ONU de que Timor-Leste não necessitava de outros 12 meses da assistência da ONU.

O Primeiro-Ministro Howard anunciou numa declaração que a Austrália era um amigo de Timor-Leste pronta a ajudar se pedisse, mas o governo de Timor-Leste ouviu esta decisão nos noticiários.

O terceiro sinal veio quando a Embaixada Australiana em Dili anunciou aos jornalistas em 15 de Maio que havia uma grande e bem armada força em Ermera pronta para atacar o Congresso. Outra vez, ministros Timorenses estavam a assegurar às pessoas que não havia base para esta declaração, mas tornou-se uma realidade em 23 de Maio quando o Major Reinado entrou em Fatu Ahi, por cima de Dili, e abriu fogo contra as forças armadas. Há também a suspeita de coordenação entre a Embaixada Australiana e o Major Reinado na marcação de uma entrevista de David O'Shea em 23 de Maio que pôs o ataque armado na filmagem da câmara.

O quarto sinal veio em 26 de Maio quando o Primeiro-Ministro Australiano Howard tinha acabado de regressar e as forças Australianas já estavam comprometidas em Timor-Leste. Ele declarou nesse dia que Timor-Leste tinha sido “pobremente governado durante anos”. Repetiu isso em 28 de Maio dizendo que tinha de haver mudança no governo de Timor-Leste. Isto alimentou uma j+a predatória agenda dos media contra o Primeiro-Ministro Alkatiri na Austrália.

O quinto sinal é que a larga presença militar Australiana em Dili não restaurou a ordem contra gangs de jovens pobremente armados, e não desarmou os grupos amotinados. Em vez disso, o clima de desordem foi o modo de fazer pressão sobre o Presidente Gusmão para demitir o Primeiro-Ministro Alkatiri, possivelmente para o substituir por José Ramos Horta. A fórmula usada era que a Austrália era estritamente neutra e que os Timorenses tinham que resolver as suas diferenças eles próprios.

O sexto sinal – mais ambíguos – é que a mulher do Presidente, a Australiana Kirsty Sword Gusmão, apareceu duas vezes na televisão, numa a dizer que o seu marido queria que o governo resignasse.

O sétimo sinal é que Portugal protestou formalmente contra a interferência Australiana nos assuntos internos de Timor-Leste no fim de semana de 27-28 de Maio.

O oitavo sinal são os artigos publicados no The Australian na semana de 29 de Maio por Paul Kelly e Greg Sheridan, projectando a opinião próxima da do governo que a Austrália do pós-11 de Setembro tem de interferir e mudar governos regionais para evitar Estados falhados. Esta opinião parece ter sido combatida pelo Departamento dos Negócios Estrangeiros. Havia também a opinião mais extremista do lobby de Jakarta que Timor-Leste nunca devia ter sido independente.

O nono sinal é a apresentação por académicos de Defesa no ANU forum sobre Timor-Leste em 9 de Junho. Três oradores declararam energicamente que o jogo era verem-se livres de Alkatiri para evitar o desperdício de mais fundos do programa de cooperação militar em Timo-Leste.

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1 comentário:

Anónimo disse...

Há medos e medos

Ontem à noite estávamos na cama, no escuro, a ouvir os ecos de fritos e de ferros a bater uns nos outros ao longe, e a minha mulher começou a contar-me como o ruído dos metais a fazia lembrar do que aontecera na terra dela, Liquiçá, em 1999. Perante a aproximação das hordas dos assassinos pirómanos da milícia Besi Merah Putih, os habitantes batiam nos ferros que arranjassem ou nos postes de electricidade para tentar atrair socorro.
Pensei no que seria crescer a sentir medo, senti um nó na garganta. Em 1999, em Portugal, eu era membro de associações de direitos humanos, de ONGs, de movimentos de solidariedade, e tinha muitos anos de convívio com a comunidade timorense aí exilada. No “Setembro Negro” estava em Bissau, num projecto de formação de professores, e quando ía à Guiné Telecom ver o meu e.mail tinha a caixa de correio cheia de mensagens de uma lista de discussão de timorenses de que era membro onde se cruzavam agora informações sobre o paradeiro de familiares de amigos meus da diáspora. Fulano tal foi morto, sicrano desapareceu mas a tia de tal disse que o viu a fugir para Dare, ou para Atambua, ou para uma valeta qualquer...
Estava solidário e triste com as dores e a ansiedade dos meus amigos, mas não estava directamente implicado. Ontem, com a cabeça da minha mulher apoiada no meu ombro, perguntei-me como era possível tantos timorenses continuarem a arranjar coragem de recomeçar de novo depois de tantas vezes terem perdido tudo: casa, bens, entes queridos... Lembrei-me de como no nosso casamento, lá em Liquiçá, ela me apresentava às amigas da escola e depois de algumas delas se afastarem acrescentava “O pai dela foi morto em 99”.
Um perfume suave emanava dos seus cabelos e continuou a falar, explicou-me que depois do massacre na Igreja se ficava agoniado com o cheiro a sangue quando ainda se estava longe do recinto.
Perguntei-lhe se agora tinha medo como nessa altura. Respondeu-me que em 99 os polícias e militares eram indonésios, os pedidos de socorro eram inúteis, o medo era sem esperança, agora é diferente, agora há a GNR.

João Paulo Esperança Segunda-feira, Agosto 07, 2006
http://blogs.publico.pt/timor/

Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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