segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Caíram acusações fabricadas contra o antigo primeiro-ministro de Timor-Leste

(Tradução da Margarida)

WSWS - 26 Fevereiro 2007
Por: Peter Symonds

A decisão do princípio do mês dos procuradores de Timor-Leste para encerrarem todas as acusações contra o antigo Primeiro-Ministro Mari Alkatiri raramente mereceu uma menção na Austrália, já para nem falar nos media internacionais. Isto aconteceu em grande contraste com a extraordinária campanha de demonização realizada em Maio e Junho passado para justificar a intervenção militar da Austrália em Timor-Leste e forçar a resignação de Alkatiri.

A acusação de que Alkatiri e o seu ministro do interior Rogério Lobato tinha armado um “esquadrão de ataque” para assassinar opositores políticos foi a acusação principal usada para remover o primeiro-ministro. Enquanto Lobato enfrenta julgamento sobre a alegada ofensa, o caco contra Alkatiri foi encerrado por falta de evidência.

Alkatiri disse aos media em Dili: “As alegações falsas, emitidas com extremo preconceito político e a máxima da má-vontade, concluíram-se que não tinham qualquer base quando foram sujeitas ao escrutínio judicial.” descreveu as acusações como “uma campanha de difamação politicamente motivada instigada contra o meu bom nome e carácter em Timor-Leste, Austrália, e noutros sítios.”

O antigo primeiro-ministro ameaçou processar a Australian Broadcasting Corporation (ABC), que foi a primeira a televisar a alegação num programa da “Four Corners”, “Stoking the Fires” em 19 de Junho. O programa fabricou uma série de afirmações sem base exactamente na altura em que o governo Australiano e os seus aliados em Timor-Leste desesperavam por um meio para remover o primeiro-ministro do cargo. Alkatiri disse ao Sydney Morning Herald: “A ABC prejudicou a minha imagem, a minha família e o meu partido.”

A demonização de Alkatiri começou antes do destacamento das tropas Australianas para Timor-Leste no fim de Maio. Os media Australianos publicaram história atrás de história a denunciar Alkatiri como um autocrata frio, culpando o seu governo da Fretilin do desassossego político que varria a pequena nação, e urgindo abertamente à sua remoção. No meio de uma série de provocações violentas por soldados amotinados, o governo Howard, com o apoio do Presidente Xanana Gusmão, pressionou Alkatiri para concordar com a entrada de tropas Australianas.

A hostilidade muito mal disfarçada de Canberra contra o governo da Fretilin reflectiu rivalidades crescentes entre a Austrália, Portugal e outros poderes por influência em Dili. Em 1999, o governo Howard despachou tropas para Timor-Leste para assegurar que a Austrália teria o papel dominante quando a meia ilha caminhava para a independência e assegurar o controlo sobre as reservas substanciais de petróleo e gás no Mar de Timor. Depois da independência formal em 2002, contudo, o governo da Fretilin virou-se para outros países para assistência—incluindo Portugal, China e Cuba—e entrou em conflito com a Austrália sobre a divisão dos recursos do Mar de Timor.

Tal como em 1999, a decisão de Howard de enviar tropas Australianas em Maio último foi motivada não por qualquer preocupação com os Timorenses, mas pela sua determinação de re-afirmar os interesses Australianos. Alkatiri, contudo, recusou submeter-se à pressão para resignar do governo e media Australianos, do Presidente Gusmão e do então ministro dos estrangeiros José Ramos-Horta. Além de que, apesar das suas ameaças, Gusmão não tinha o poder constitucional para remover Alkatiri do cargo sem aprovação do parlamento, onde a Fretilin tinha uma grande maioria. No meio deste tenso finca-pé político, a ABC emitiu convenientemente as alegações anti-Alkatiri.

O programa da “Four Corners” foi uma peça de propaganda política despudorada. A afirmação de que Alkatiri estava envolvido na armação de um “esquadrão de ataque” baseava-se em afirmações de inimigos políticos seus—incluindo polícias e soldados amotinados que obviamente eram hostis ao governo da Fretilin. O líder do esquadrão—Vincente “Railos” da Conceição—era uma pessoa de carácter altamente duvidoso e não deu nenhuma razão plausível para a sua repentina mudança de lealdade da Fretilin para a oposição. Contudo as suas alegações foram sem hesitação relatadas como boas pela jornalista da ABC Liz Jackson.

O Presidente Gusmão mandou imediatamente a Alkatiri uma gravação do programa, juntamente com uma nota a pedir a resignação do primeiro-ministro. Mas Alkatiri negou ter armado Railos e recusou sair. Entre outros pontos, Alkatiri anotou o carácter contraditório das alegações. Estava a ser acusado de formar um esquadrão de ataque que tinha estado envolvido em atacar unidades das forças armadas leais ao seu governo. Levou mais uma semana de assédio, ameaças legais e escalada de tensões políticas antes de finalmente Alkatiri ter cedido e resignado em 26 de Junho. Ramos-Horta, que tinha laços de há muito com a Austrália, foi instalado no seu lugar em 10 de Julho.

O facto de os procuradores terem decidido agora encerrar as acusações contra Alkatiri por falta de evidência é uma acusação contra todos os envolvidos nesta conspiração política: não somente Gusmão e Ramos-Horta, mas o governo Australiano e os media, acima de todos a ABC. Pela sua parte, Liz Jackson ganhou um prémio Walkley dourado, o prémio de topo do jornalismo da Austrália, pelo seu programa da “Four Corners”, o que, dada a extraordinária falta de qualidade da sua “investigação” só pode ter sido por serviços políticos prestados.

A decisão para deixar cair qualquer acusação contra Alkatiri fora prevista em Outubro passado quando uma comissão especial de inquérito da ONU não encontrou qualquer evidência “na base da qual pudesse recomendar que Mari Alkatiri devia ser processado por estar envolvido na posse ilegal ou uso de armas”. O relatório pediu mais investigações para determinar se Alkatiri sabia mais sobre armação ilegal de civis do ministro do interior Lobato. Mas quatro meses mais tarde o caso foi encerrado.

A comissão da ONU, que foi requerida por Ramos-Horta, estava longe de ser independente ou sem preconceitos. Os seus termos de referência foram estreitamente confinados a incidentes específicos de violência em Timor-Leste durante Abril e Maio de 2006. O relatório não fez nenhuma referência ao papel do governo Australiano, antes, durante ou depois da sua intervenção militar. A comissão ignorou o facto de soldados e polícias amotinados serem claramente culpados de pegarem em armas contra o Estado e em vez disso pôs o foco em casos de violência estritamente limitados. Mesmo assim, o relatório da comissão foi forçado a recomendar acusações contra Railos e um outro amotinado sombrio o “Major” Alfredo Reinado, que esteve também envolvido nos ataques contra tropas do governo. Durante a crise, Reinado gozou de uma relação particularmente estreita com os media Australianos, bem como com sectores das forças armadas Australianas.

Até agora o único julgamento tem sido o de Lobato. Railos e Reinado parecem ter uma vida charmosa. Railos participou na cerimónia de investidura de Ramos-Horta como primeiro-ministro o ano passado e subsequentemente foi filmado a participar numa cerimónia organizada pelo Presidente Gusmão.

Reinado continua ao largo, depois de ter conseguido sair pelo seu pé literalmente da prisão principal de Dili em Agosto passado ao lado de mais de 50 de outros presos. De acordo com o Age, oficiais das forças armadas Australianas podem ter estado envolvidos na negociação dos termos da sua rendição e por isso das acusações que enfrentará. Um acordo anterior caiu este mês depois do governo da Fretilin se ter oposto por ser inconstitucional e discriminatório.

O arquivamento das acusações contra Alkatiri constitui um golpe contra os seus opositores políticos no caminho para as eleições presidenciais e parlamentares agendadas para este ano. No que foi sem dúvida um acordo feito entre os dois, Horta tem a intenção de concorrer nas eleições presidenciais em Abril, enquanto Gusmão indicou que concorrerá ao parlamento à frente de um novo partido—o Conselho Nacional da Resistência Timorense (CNRT). O objectivo, como explicou o Sydney Morning Herald, “é derrubar a Fretilin do seu pedestal como força política dominante e remover a sua maioria no parlamento”.

Sem acusações pendentes sobre a sua cabeça, Alkatiri está agora livre para fazer campanha em favor da Fretilin. O Australian de Mudoch, que teve um papel proeminente na demonização de Alkatari o ano passado, lançou um aviso num editorial em 7 de Fevereiro que “o regresso de Mari Alkatiri pode desestabilizar mais Timor-Leste”. Não há nenhuma dúvida que o governo de Howard, com a assistência dos media Australianos trabalhará para assegurar a sua derrota—por todos os meios disponíveis, incluindo mais provocações.

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Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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