sábado, novembro 17, 2007

Timor:Ramos Horta compara acordo secreto à Cimeira de Berlim

Diário Digital / Lusa
16-11-2007 15:01:00

O Presidente timorense José Ramos-Horta afirmou hoje em Lisboa que o acordo de quatro potências anglófonas, em 1963, sobre a integração da ex-colónia portuguesa de Timor na Indonésia é comparável à Conferência de Berlim.

Para o Presidente de Timor-Leste, a iniciativa secreta dos Estados Unidos da América, Austrália, Reino Unido e Nova Zelândia «tem paralelo com a conferência de Berlim», que no século XIX levou à partilha do continente africano pelas potências coloniais europeias.desvalorizou hoje

Ramos-Horta, que se encontra em visita oficial a Portugal, a primeira desde que foi eleito chefe de Estado em Maio passado, e que falava numa conferência de imprensa, salientou, no entanto, que a intenção dos quatro países anglófonos «não era séria».

«Não me parece que tenha sido uma intenção séria. Não passou de uma conversa informal de diplomatas, que não teve em linha de conta o factor Portugal. Era impensável que naquela altura Portugal aceitasse esta iniciativa», frisou Ramos-Horta.

A integração de Timor-Leste na Indonésia foi acordada secretamente, sem conhecimento de Portugal, em Washington, em 1963, segundo revelou à Lusa Moisés Silva Fernandes, investigador de ciências políticas e de relações internacionais da Universidade de Lisboa.

Através da análise de documentos da época, Moisés Silva Fernandes verificou que altos responsáveis políticos do Reino Unido, Austrália, Estados Unidos e Nova Zelândia tiveram dois encontros em 1963, em Washington, onde «chegaram a acordo sobre a incorporação de Timor-Leste, numa política de apaziguamento em relação à Indonésia», afirma o investigador.

«Estes encontros foram secretos, Portugal nunca foi informado de nada», adianta.

Um dos documentos analisados por Moisés Silva Fernandes é um telegrama remetido em 13 de Fevereiro de 1963, pela embaixada australiana em Washington para o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, em Camberra, no qual dava conta do acordo obtido pelas quatro partes, que nessa data se encontravam na capital norte-americana para a primeira das suas reuniões.

«Sobre Timor, todos concordámos que mais tarde ou mais cedo a Indonésia vai apoderar-se da parte portuguesa da ilha de Timor e todos à volta da mesa tornaram bem claro que os seus governos não estavam preparados para envolver forças militares para evitar esta situação», lê-se no relatório da diplomacia australiana.

Noutro dos documentos encontrados pelo investigador português no Arquivo Nacional da Austrália, e recentemente abertos à consulta pública, consta um outro texto, escrito pelo embaixador da Austrália em Jacarta para o seu primeiro-ministro, Robert Menzies, datado de 7 de Março de 1963 e com a classificação «top secret».

«Devemos ao mesmo tempo convencer os indonésios que não teremos objecções a uma eventual incorporação do Timor português na Indonésia, desde que isto venha a ocorrer através do uso de meios aceitáveis», afirma o diplomata australiano, confirmando o acordo obtido em Washington.

Em Outubro de 1963, os quatro países anglófonos voltaram a reunir consenso sobre Timor-Leste em Washington. «O ideal do nosso ponto de vista seria que os portugueses cedessem Timor de boa vontade e de um modo que a transferência para a Indonésia não seja o resultado de uma agressão ou de um movimento cínico apaziguador para o Presidente (indonésio) Sukarno, lê-se num documento secreto de preparação da diplomacia londrina para o segundo encontro quadripartido e agora encontrado por Moisés Silva Fernandes no arquivo do «Foreign Office» britânico.

Ramos-Horta acrescentou que a iniciativa daqueles quatro países encontra ainda paralelo com a intenção manifestada «logo a seguir à II Guerra Mundial, quando a Austrália quis comprar Timor».

«A iniciativa (dos quatro países) não será muito diferente de uma outra tentativa, logo a seguir à II Guerra Mundial, quando a Austrália quis comprar Timor e pediu a mediação do Reino Unido», disse.

Para o investigador português, a interpretação dos novos dados é clara. «Onde outros podem ver realpolitik, eu vejo cinismo», comenta Moisés Silva Fernandes .

A Indonésia invadiu Timor-Leste em 7 de Dezembro de 1975, 12 anos após estas reuniões secretas, e, com o silêncio das potências ocidentais, ocupou o território até à consulta popular de 30 de Agosto de 1999, cujo resultado conduziu à independência do país asiático de expressão portuguesa.

Moisés Silva Fernandes revela no sábado as suas conclusões, do ponto de vista académico, num seminário na Universidade de Oxford sobre assuntos portugueses e lusófonos.

Posteriormente, tenciona escrever um artigo sobre as suas revelações históricas a propósito de Timor-Leste, em inglês, na revista científica de estudos internacionais South European Society & Politics e incluir os novos elementos históricos, em português, num livro dedicado aos anos de 1974 e 1975 em Timor-Leste, a lançar em 2008.

NOTA DE RODAPÉ:

Não haveria Horta de desvalorizar a culpa dos amigos anglófonos...

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Traduções

Todas as traduções de inglês para português (e também de francês para português) são feitas pela Margarida, que conhecemos recentemente, mas que desde sempre nos ajuda.

Obrigado pela solidariedade, Margarida!

Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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