quinta-feira, abril 24, 2008

"Depois do 11/2, nada é igual", diz Ramos Horta

Díli, 23 Abr (Lusa) - O Presidente da República de Timor-Leste afirmou hoje no Parlamento Nacional que "depois do 11 de Fevereiro [data do atentado de que foi alvo], nada é igual".

"Mudámos uma página da história de Timor-Leste. Deus não dividiu o Mar Vermelho perante os Israelitas até a água chegar aos seus narizes", afirmou José Ramos Horta num longo discurso marcado por referências bíblicas e religiosas.

O Presidente da República regressou ao país a 17 de Abril, após mais de dois meses na Austrália, onde recuperou dos ferimentos graves que sofreu em Fevereiro no ataque à sua residência.

O chefe de Estado revisitou as circunstâncias do ataque de que foi alvo e traçou as linhas que considera importantes para o futuro de Timor-Leste.

José Ramos Horta defendeu a prioridade do combate à pobreza, a alteração da Lei do Fundo do Petróleo, a inclusão da Fretilin e de "ex-titulares" na definição de políticas, a consolidação das forças de segurança e a resolução do problema dos deslocados internos.

Sublinhou a importância da reconciliação nacional e do perdão, anunciando um indulto presidencial para cerca de 80 presos, que inclui o ex-ministro do Interior, Rogério Lobato.

"Martin Luther King, Mahatma Ghandi, Olof Palme, John F. Kennedy, Robert F. Kennedy, Patrice Lumumba, Kwame N'Kruma, Amílcar Cabral, são alguns dos grandes nomes do século XX que não sobreviveram às balas dos assassinos", recordou o Presidente no seu discurso de cerca de hora e meia, na sua maioria em tétum.

"Deus os chamou para junto de si, privando a Humanidade da sua grandeza moral, força intelectual e inspiradora. Mas eles legaram para a Humanidade as grandes lições que ainda hoje nos inspiram. Esta sua herança é eterna e nos inspira no dia a dia", considerou José Ramos-Horta.

"Eu sobrevivi às duas balas disparadas a menos de 20 metros de distância. Sou pequeno comparado com a grandeza daqueles mártires que sempre foram a minha inspiração. E pergunto porque Deus quis que eu vivesse mas nos privou desses grandes homens. Só Deus sabe", acrescentou o Presidente timorense.

"Sem a intervenção divina e a sabedoria e dedicação dos médicos e enfermeiros em Díli e Darwin (Austrália), eu não estaria hoje entre vós. Quis Deus que eu sobrevivesse", afirmou José Ramos Horta no início da sua intervenção.

"Os estilhaços das balas que me atingiram pararam a poucos milímetros da coluna e a poucos centímetros do coração e do pulmão. Nenhum órgão vital foi atingido", explicou.

"As orações, as vigílias, os rituais sagrados que têm a força de milhares de anos e a recepção de que fui objecto no dia 17 de Abril, reflectem a grandeza do vosso coração, da vossa bondade, a grandeza deste nosso povo. Não sabia que merecesse tanto, eu que sou um pecador", continuou o chefe de Estado.

"No dia 11 de Fevereiro, eu não tinha nenhum encontro marcado com o senhor Alfredo Reinado. Não agendei nenhuma reunião com o senhor Alfredo Reinado na minha residência", explicou o Presidente da República sobre o dia do ataque.

"Revelando uma total falta de respeito pelo chefe de Estado, o senhor Alfredo Reinado e o seu grupo forçaram a sua entrada na minha residência, desarmaram elementos da segurança pessoal do Presidente da República e apropriaram-se ilegalmente de mais armas. Este comportamento não é de quem vem para dialogar", acusou.

"Relativamente a Gastão Salsinha, ao tornar-se cúmplice de Alfredo Reinado, perdeu toda a legitimidade ou razão para fazer exigências e dirigir-se ao chefe de Estado", declarou o Presidente.

"Gastão Salsinha deve entregar-se imediatamente, entregar todas as armas e enfrentar a justiça", apelou José Ramos Horta ao ex-tenente que, de Janeiro de 2006 a Fevereiro de 2008, liderou os chamados peticionários das Forças Armadas.

"Este senhor não representa os peticionários, os quais escolheram acantonar-se, e não merece o título de tenente das Forças Armadas. O seu comportamento não é próprio de um oficial", disse hoje o chefe de Estado.

"O regresso desses dois elementos às Forças Armadas é inaceitável e não poderia, nunca, ter o meu apoio", disse também José Ramos Horta sobre Salsinha e Reinado.

"Não sou pacifista utópico. Sou pacifista realista e pragmático que acredita na via do diálogo, mas tão pouco acredito cegamente no diálogo quando se sabe que o outro lado se quer impor pela via das armas", sublinhou, ao recordar as iniciativas que, nos últimos dois anos, liderou para resolver o caso de Alfredo Reinado e o problema dos peticionários.

O Presidente da República repetiu no seu discurso apelos à unidade nacional em torno de "grandes causas nacionais".

"Continuar divididos, cada um na sua trincheira, guerreando-nos, em nada nos ajuda a ultrapassar a crise", defendeu.

"Temos de saber gerar soluções de inclusão política e institucional", frisou o Presidente, que pretende continuar o diálogo político iniciado antes dos ataques de Fevereiro entre os partidos da aliança no Governo e a Fretilin, vencedora das legislativas de 2007.

"Peço, em especial, ao ex-primeiro-ministro, Mari Alkatiri, companheiro e amigo de muitos anos, que contribua com o seu gabinete, tornando-o um gabinete de apoio ao desenvolvimento, nos aspectos político, económico, social e institucional", pediu José Ramos Horta.

O Presidente timorense alertou para tentativas de desestabilização e divisão vindas do estrangeiro.

"Em 1975, houve interferências e manipulações externas na situação interna do país. Alguns de nós caímos na teia, preparada contra nós por interesses exteriores, e guerreámo-nos na primeira guerra civil da história deste país", lembrou o chefe de Estado.

"Em 2006, houve elementos estranhos que fomentaram a divisão entre a PNTL (Polícia Nacional) e as F-FDTL" (Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste), recordou.

"Logo a seguir à tentativa de assassinato que me visou e ao primeiro-ministro, surgiram mútuas acusações entre dirigentes timorenses, sem se deterem a pensar se, uma vez mais, elementos estranhos a este país estariam implicados nestes hediondos crimes", salientou o Presidente da República.


PRM
Lusa/fim

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Mensagem inicial - 16 de Maio de 2006

"Apesar de frágil, Timor-Leste é uma jovem democracia em que acreditamos. É o país que escolhemos para viver e trabalhar. Desde dia 28 de Abril muito se tem dito sobre a situação em Timor-Leste. Boatos, rumores, alertas, declarações de países estrangeiros, inocentes ou não, têm servido para transmitir um clima de conflito e insegurança que não corresponde ao que vivemos. Vamos tentar transmitir o que se passa aqui. Não o que ouvimos dizer... "
 

Malai Azul. Lives in East Timor/Dili, speaks Portuguese and English.
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